reflexões, teatro

escrever sobre o que não se entende

relato sobre a experiência de assistir “Syn” (“The Son”), do Grupa Wolność (Polônia), no PUPPETNOPUPPET -International Festival of Puppetry Schools

este texto começou a ser escrito no formato #curtinhas, para ser publicado exclusivamente no @manteraruina – perfil para a comunidade de apoiadores da campanha “para manter a ruína acesa” (faça parte tornando-se um colaborador!). pela singularidade da ocasião, decidi também postá-lo aqui.

Wolność significa liberdade em polonês. eu só descobri isso porque, para acentuar o “s” e o “c”, pesquisei o termo no google, já que não consegui fazer isso no teclado. writing about what we don’t understand. escrever sobre o que não se entende. fiz minhas anotações em inglês. a obra, de puppet theatre (que me parece uma espécie de enrosco traduzir simplesmente como ‘teatro de marionetes’, mas vamos ficar por aqui ao menos por enquanto), tem bastante diálogo. em polonês. eu não sei sobre o que a peça fala. eu só vi. e escrevo essas poucas palavras a partir do que imagino ter visto.

no prólogo, em vídeo no foyer do teatro, três atores manipulam um boneco. mas também constroem uma espécie de diálogo em suas reações. a voz da figura surge como que em off. é uma pequena sala. o boneco aparenta representar um homem velho tomando chá, ou café, ou… não sei. ele representa uma ausência. uma presença que não pode estar concretamente ali; mas ele é também concreto, materialidade – quase pura, pra mim, que não entendo suas falas e assim fico distante de sua narrativa, do que lhe constitui para além da imagem.

no palco, uma mesa. um nascimento de um bebê, através do encher e estourar uma bexiga. ele vai crescer. um boneco velho observa. ele está mais velho. recebe soro. há também uma boneca velha, menos em evidência. ela também apareceu no vídeo inicial, e o bebê também. não quero ser descritivo, mas é difícil neste caso. há muitas camadas de ambiguidade – ainda mais nessa não-compreensão. o que cada escolha na lida com a manipulação dos bonecos (será que eu deveria usar ‘marionetes’?) significa? há uma certa performatividade na ação dos atores, ou uma tentativa de representar uma performatividade.

é uma família, mas também parece ser a história. é político? certas imagens parecem dizer mais do que aquela materialidade íntima, afetiva, divertida, bruta, estranha. tecnicamente, algumas pequenas questões parecem carecer de uma maior precisão. a teatralidade é abundante. seus efeitos – como o uso de imãs sob a mesa para mover um pequeno bebê-boneco sobre ela – e as materialidades dialogando – a trilha é executada ao vivo com um instrumento de sopro que não sei qual é e também em certos momentos com uma flauta doce; a cenografia dinamiza as movimentações propostas e desenvolve-se na direção de composições inesperadas (um ventilador torna-se um furacão ou algo assim quando é ligado com tiras de plásticos presas nele) e eu não sei sobre o que eles estavam falando. mas Wolność é liberdade em polonês e essa informação já diz muito. escrever sobre o que não se entende, de forma honesta, talvez seja uma dessas pequenas liberdades. uma que a arte costuma oferecer.

a #curtinha ficou um pouco longa. são 22h36 em Bialystok, e essa foi minha primeira experiência no PUPPETNOPUPPET.