teatro

se questionar e passar a existir

crítica de “Isso não é arte”, espetáculo de formatura da turma 7SB/2017-2 do curso técnico-profissionalizante do Teatro-escola Célia Helena

Fundamental à um exercício de conclusão de curso de teatro é o desenvolvimento de um pensamento acerca do que significa o fazer artístico e a responsabilidade imbricada a esse fazer. Em “Isso não é arte”, montagem de formatura do 7SB com direção de Liana Ferraz, é a perscrutação realizada pelos alunos-atores desta questão que estrutura a cena.

Partindo, em livre inspiração, do clássico “Seis personagens a procura de um autor”, de Luigi Pirandello, se colocam em cena nove atores a procura de um lugar no mundo. Compreendendo o entorno que os circunda e as possibilidades de romper as barreiras que nos cercam – sejam nossas próprias, sejam das exigências mercadológicas, sejam de uma censura fascistóide que teima em perdurar – os nove jovens desenvolvem uma série de tentativas de pertencimento.

Com uma linguagem cênica propositalmente suja e tosca, entre escombros brasileiros – a ver pelos elementos verdes e amarelos, que inevitavelmente remetem a folias e outros atos justificados por subterfúgios patrióticos, ainda que veladamente impulsionados por outros fins – os atores se colocam no centro da questão por serem, efetivamente, agentes daquilo que questionam e criticam; com dedos apontados para tantos lugares, é inevitável e primordial que muitos apontem para si mesmos.

Se colocando em xeque, desenvolvem dramaturgias próprias e remetem aos clássicos – além de trazer o próprio Pirandello, a voz de Medéia ecoa fortemente em uma cena, como que lembrando da potência que o teatro traz em sua essência e ainda diz aos nossos tempos – ao mesmo tempo em que brincam com o próprio fazer.

Ao se incluírem como não apenas objetos mas também sujeitos do problema, há uma pungente honestidade levada ao jogo cênico a partir do pensamento de cada um. Assim, em um acordo que reinventa convenções à cada instante, a encenação não se mostra em nenhum momento pedante, tampouco pretensiosa. Trata-se efetivamente das tentativas, ainda sem respostas, ainda repletas de dúvidas estruturais, de compreender o que se considera – e do que se faz – arte hoje.

Ainda assim, em um contraste que de certo modo não se opõe à tal humildade, a encenação é recheada por momentos de grande precisão, seja na narrativa, no lirismo ou na brilhante coreografia final – assinada por Karina Almeida – onde, mesmo que sem respostas concretas acerca das incertezas do fazer, os formandos seguem em movimento; caminhando, como que em uma espiral sem fim onde o horizonte é incerto, porém nunca parando. E compreendendo a potência que há em estarem juntos, mas sem esquecer que um coletivo só é tão forte quanto os indivíduos que o compõem, como no retorno ao coro dos rompantes de partituras solo, lembrando que as ondas, por mais impactantes que sejam, não existem sem o mar.